Desafios da transformação digital no setor da educação

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Habituado a pensar em inovação na sala de aula, o Grupo Ânima Educação, um dos maiores do setor no país, foi surpreendido pela necessidade de inovar também na sua forma de operar. Conheça as dificuldades e resultados alcançados no caminho da empresa para se tornar digital.

"A educação é dos poucos setores da economia que talvez ainda não tenha se transformado como deveria, e há uma disrupção muito grande por vir."

Marcelo Battistella Bueno, CEO Ânima Educação

Há seis meses, embarcamos no desafio de apoiar o grupo Ânima Educação em seu processo de transformação digital. O desafio não é pequeno, considerando que a Ânima é o quarto maior grupo de ensino superior no Brasil - com 100 mil alunos em sete instituições com campus espalhados em cinco estados - e que, como disse Marcelo Bueno, CEO do grupo, em evento realizado pela CI&T, ainda há muito por fazer no setor.
 
E, nesses 180 dias, tenho acompanhado uma rápida e exemplar jornada de mudança, com a qual lideranças e equipes de todas as áreas da empresa têm se comprometido profundamente. Exatamente por isso, apesar de ser um processo em fase inicial, aceitei o convite da HSM para, ao lado de Gabriel Ribeiro, VP de Estratégia e RI da Ânima, apresentar caminhos, estratégias e primeiros resultados em um webinar em outubro.
 
Neste artigo, me dedico a trazer um panorama geral dessa jornada pela minha perspectiva e também pela visão do Gabriel, apresentada no referido webinar, a fim de trazer dados e insights que possam ser úteis às companhias que também estejam em processo de transformação - ou a ponto de entrar nele.  

O início

A exemplo de muitos dos nossos clientes, a Ânima chegou com muita certeza de qual era o problema a ser resolvido e como isso deveria ser feito. A demanda que o grupo nos trouxe foi a de uma migração tecnológica: de um ERP acadêmico com um sistema muito antigo, queria evoluir para uma plataforma que imprimisse mais agilidade e velocidade aos processos internos. Dito isso, queria o orçamento e saber quais eram os prazos, o cronograma de entrega da nova arquitetura de software.
 
Porém, analisada a questão, percebemos que a migração tecnológica era apenas um paliativo que não entregaria os resultados que a companhia buscava. A operação não se tornaria mais veloz como um todo nem mais ágil para solucionar as dores que os clientes apontavam, apenas teria uma nova ferramenta e novos processos com poucos ganhos. O problema real a ser resolvido era a forma como a empresa desenvolvia e, sobretudo, pensava seus produtos digitais. Portanto, não havia prazos nem cronograma, e sim a necessidade de estabelecer uma nova forma de trabalho que impactaria toda a companhia. Era preciso realizar uma transformação digital.
 
Como fazer as lideranças perceberem essa nova necessidade? O primeiro passo foi fazer algumas provocações positivas para instigar uma reflexão em relação ao que deveria ser o verdadeiro objetivo da empresa, dadas as características do contexto digital. Como não se pode falar em digital sem considerar que atender às necessidades do cliente deve ser o foco, logo perceberam que não se tratava apenas de tornar a operação mais ágil e veloz, mas de entregar mais valor para o aluno.

"Temos, no ecossistema Ânima de aprendizagem, um cuidado muito grande com inovação, mas acabamos esquecendo de pensar o aluno não só na sala de aula, mas também como cliente."

Gabriel Ribeiro

E aqui, a primeira grande surpresa do processo: quando puxamos o cliente Ânima para o centro das discussões, para pensar nele antes de tomar as decisões do que deveria ser feito, as lideranças se deram conta de que não conheciam de verdade as suas necessidades. Nas palavras de Gabriel, "a primeira revelação é que ninguém conhecia a jornada do aluno. Ninguém havia, de fato, feito os passos que os alunos tinham que fazer". Nesse momento, também de acordo com Gabriel, ficou muito evidente que era preciso mudar totalmente a forma de pensar a operação, mudar a cultura da empresa em direção ao novo foco.

"Foi quase por acaso essa descoberta da necessidade de transformação digital porque, apesar de ser uma expressão muito utilizada, pouca gente sabe o que ela significa ou o que fazer exatamente com ela."

Gabriel Ribeiro

Os caminhos da transformação digital Ânima

O que aconteceu a seguir foi uma aposta e um comprometimento forte das lideranças no caminho que propusemos: o modelo de transformação digital desenvolvido na CI&T, que se baseia na filosofia de gestão Lean aplicada ao contexto digital. A esse modelo chamamos Lean Digital Transformation (LDT).
 
Uma peculiaridade do processo da Ânima, em relação a outros contratos nossos, é que ele foi bastante simplificado pelo fato de que o grupo já conhecia e aplicava o Lean para resolver problemas pontuais de negócio, restritos a iniciativas de departamento. Os gestores, então, estavam familiarizados com a linguagem, a lógica e os princípios da metodologia.
 
No entanto, a LDT é orientada a implementar a filosofia de uma forma muito mais ampla, como um novo fundamento de toda a operação. O modelo visa transformar a cultura da corporação por completo, apoiando-a sobre princípios do Lean, como a busca pelo que é valor para o consumidor em primeiro lugar, o pensamento de melhoria contínua, a eliminação do desperdício e a colaboração. Além disso, valorizamos premissas do digital, da metodologia Agile, como a implementação de times multidisciplinares e a adoção da cultura da experimentação em ciclos curtos de testes e validação, além de práticas de cocriação emprestadas do Design que, como costumo dizer, têm o enorme poder de criar engajamento para o novo formato.
 
Como isso funciona na prática? Explico os passos que demos lado a lado com a Ânima. O primeiro foi a identificação do real objetivo da empresa que, como já dito, era tornar-se mais ágil e eficiente na atenção às necessidades dos alunos. O segundo passo foi identificar o problema mais urgente a ser resolvido, a principal dor dos alunos. Para isso, partimos para um processo de Hoshin Kanri, uma metodologia de planejamento, execução e desdobramento das estratégias das organizações usada pelo Lean. Nele, lideranças de várias áreas se unem em dinâmicas estruturadas e colaborativas de discussão e consenso sobre os principais problemas de negócio (ou oportunidades, como preferimos entender) e criação de hipóteses de solução para eles.
 
Para que o processo funcione e, de fato, seu resultado seja a soma do conhecimento coletivo e não a opinião dos cargos mais altos, é necessário, como disse o Gabriel Ribeiro, "deixar o crachá do lado de fora das reuniões". E a Ânima realmente se comprometeu com essa ideia, dando voz a todos e abraçando a premissa da cocriação.
 
Assim, no Hoshin, usamos técnicas de design, como seguir os passos dos clientes e realizar entrevistas diretas com eles, para mapear a jornada do aluno e encontrar insatisfações. Então, descobrimos que melhorar o processo de rematrícula online era o principal problema, a prioridade número um a ser trabalhada. A partir daí, usando o A3, uma ferramenta de resolução de problemas do Lean, desenhamos conjuntamente as hipóteses de solução.
 
A seguir, definimos uma estratégia de ação escalonada, dividida por metas a serem alcançadas a cada período de três meses. Para explicar o porquê desse modelo e como funciona, usamos a metáfora da "subida de uma montanha", onde o objetivo maior, o cume, só pode ser alcançado com segurança se dividido em etapas, que chamamos de camps, dadas as características inóspitas do trajeto. O mesmo vale para uma jornada de transformação digital. Considerada a velocidade das mudanças que o mercado e a tecnologia impõem, não se deve basear os passos a serem dados nas orientações de um roadmap estático. Ao invés disso, devem-se estabelecer metas por período e, alcançada a primeira, analisar o novo contexto que se apresenta, somar os aprendizados adquiridos, envolver mais pessoas para ir ganhando escala e traçar o novo objetivo até o "cume da montanha".
 
Porém, para sustentar a transformação, cada camp deve trazer resultados de negócio significativos. Isso porque a jornada pode ser muito transformadora, mas se não houver impacto de negócio ela perderá força e, muito provavelmente, a empresa voltará ao conhecido, ao formato antigo de operar.
 
O objetivo do nosso primeiro camp, como já dito, era agilizar o processo de rematrícula. Então, partimos para a ação. Formamos equipes multidisciplinares, com profissionais de áreas como tecnologia, negócios e marketing da Ânima e da CI&T dedicados exclusivamente a trabalhar com esse produto, essa cadeia de valor de ponta a ponta, desde a ideação até a entrega e posteriores atualizações.

"Não é um projeto da área de tecnologia, mas de toda a empresa, e há pessoas de todas as áreas participando. Montar times mistos e ir ganhando independência para ir fazendo sozinho. Esse é o caminho."

Gabriel Ribeiro

Essas equipes trabalham com a lógica do Minimum Viable Product (MVP), uma prática da metodologia Agile usada pelas startups que propõem-se a lançar rapidamente uma versão simples e enxuta - porém, completa e qualificada - de um produto para resolver rapidamente uma necessidade do consumidor. Após o lançamento, analisam-se os feedbacks dos usuários, e os problemas apontados vão sendo corrigidos rapidamente com uma melhora incremental e contínua. Assim, desenvolveram-se experimentos de novas features em ciclos curtos de testar, validar com os usuários e ajustar.
 
Depois disso, outras equipes foram assumindo novos objetivos, novas cadeias de valor, e assim a nova forma de operar vai ganhando escala de forma gradual e segura rumo à transformação digital.

"Tecnologia não pode ser mais um departamento, tem que ser uma competência da empresa. E nós estamos dando os primeiros passos para dar mais escala e velocidade ao que a gente aprendeu até agora."

Gabriel Ribeiro

Resultados

Nesses 180 dias, a Ânima apresentou resultados importantes de negócio, como a redução de 70% do lead time do novo produto digital em relação ao tempo médio de produção das soluções que eram desenvolvidas nos moldes anteriores. Além disso, esse produto, inovador e atraente, tem uma base tecnológica que permite ganhar escala com velocidade. Outro ganho apontado por Gabriel Ribeiro foi um aumento do nível de satisfação (Net Promoter Score, ou NPS) com a nova solução oferecida para a rematrícula dos alunos.
 
Um indicador importante do sucesso desse primeiro produto também é o fato de que 82% dos alunos passaram pelo processo de rematrícula, antes problemático, sem necessidade de suporte algum por parte da Ânima. Por ser friendly e ter um viés muito forte de autosserviço, o aluno pode realizar o processo sozinho e de forma rápida. Com esse retorno, nosso próximo foco é a solução das dificuldades apontadas pelos 18% que precisaram de auxílio.
 
Quanto aos avanços na mudança cultural e na transformação digital da empresa como um todo, o processo está conseguindo ganhar escala de forma orgânica, somando novas equipes a cada novo camp ou nova cadeia de valor a ser trabalhada. Aos poucos, o grupo vai sendo contaminado de forma positiva por esse novo mindset Lean, colaborativo, multidisciplinar e ágil.

"Um dos grandes resultados foi tirar todos da empresa da zona de conforto de uma maneira positiva, criando uma ansiedade positiva. Todos estão querendo participar. Todas as equipes, inclusive na liderança. Esse efeito é muito importante porque todas as indústrias estão com desafios de negócios e devem se mexer, devem se transformar. Ninguém mais pode ficar acomodado, preso aos paradigmas antigos.”

Gabriel Ribeiro

Assista à entrevista realizada com Mauro Radomille sobre a Transformação digital da Anima Educação.


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